Boteco chinfrim aquele.
Mesas e cadeiras enferrujadas misturadas a um monte de engradados de cerveja encostados num canto.
No balcão, uma pequena vitrine com três coxinhas de galinha de anteontem. Dava para sentir quão frias e geladas estavam, já que o ambiente de quente só tinha a cachaça.
Nada ali lembrava a elegância e o charme do botequim da praia de onde ele tinha saído, e enchido a cara cheia dos números da reunião de negócio.
O pneu do carro havia estourado, e a barriga arrebentando da farta comida do almoço. Tinha que botar para fora.
Antes de entrar já tinha chamado o hugo junto ao pé da árvore na calçada.
Mas por um acidente do destino estava ali.
A cabeça confusa não conseguia distinguir a diferença entre aquele lugar e qualquer outro boteco da moda de Ipanema.
Antes de entrar já tinha chamado o hugo junto ao pé da árvore na calçada.
Mas por um acidente do destino estava ali.
A cabeça confusa não conseguia distinguir a diferença entre aquele lugar e qualquer outro boteco da moda de Ipanema.
Estava à procura de um sonrisal que fosse, e um copo d’água que fizesse o pozinho borbulhar.
Logo que entrou viu na prateleira aquilo que buscava. A estante mais parecia um balcão de farmácia: engov, eno, leite de magnésia, aspirina. Até uma réstia de camisinhas desbotadas tinha.
O olhar delirante passou batido em direção ao banheiro. Tinha que dar uma cagada e colocar para fora aquilo que me confundia o seu estômago.
A porta sem tranca mostrava o vaso sanitário todo respingado de merda, e as paredes repletas de inscrições, todas banais, de baixo calão.
Nessas horas o sujeito não consegue perceber a higiene. É a necessidade, o sufoco, o aperto da barriga, ou da bexiga querendo urinar.
O primeiro movimento saiu pela boca. Um vômito meio esverdeado de um fígado cambaleante. Depois veio o bolo de mignon digerido com vinho, uma merda fedida, mole e nojenta.
A entrada, no que passou pelo balcão até chegar ao quartinho pediu ao dono do estabelecimento alguma coisa que parecesse papel.
Nem precisava ser macio como a neve, bastava apenas que cumprisse a função. Quando moleque pobre de subúrbio cansou de usar a folha do caderno da escola, aplicando a técnica de amassar antes. Passou no cú a tinta do jornal com a notícia da sacanagem dos caras com a flotilha da liberdade. Não sabia por que, mas o nojo que sentiu pelo noticiário era maior do que o que sentia pelo vaso sanitário
Com o rabo velho limpo foi logo procurando pela descarga. Não queria deixar nenhum vestígio da sua passagem por ali. Gritou ao dono do boteco perguntando "onde ficava a descarga" e este lhe respondeu dizendo que mais tarde jogaria uma lata d’água para limpar a fedentina.
Estava se sentindo um sórdido bebum, caído na sarjeta, envolto em cheiros e perfumes os mais desagradáveis, percebendo naquele momento a miséria de qualquer cachaceiro de rua.
Mas se sentiu satisfeito ao completar aquilo que fora fazer ali.
Depois do copo de água borbulhante com aquele santo remédio foi aos poucos voltando a normalidade, louco de vontade de beber uma gelada. Pediu uma que, sem lhe negar, desceu redonda como o slogan que a propaganda lhe deu.
Com a cabeça no lugar teve a idéia de retribuir o favor, como se não fosse uma obrigação da lei manter um bar com um banheiro decente.
Do sujeito atrás do balcão ouviu a resposta que lhe pagasse apenas o que devia. Na certa ele não era o primeiro a derramar o porre pelo seu chão, ressaqueado.
Mas como não era daqueles que se submete a trama insistiu, perguntando o que havia para comer, além das defuntas coxinhas.
Veio a surpresa. O cara lhe trouxe um prato de um suculento mocotó, repleto do que sobrara do almoço, acompanhado por uma garrafa de farinha, o qual derrubou na hora.
"Divina comida!" exclamou As colheradas quentes aquecidas pelas gotas do molho ardido de pimenta foram descendo, e se acomodando como uma luva em cada tripa da sua barriga.
Bem, para não ficar encompridando a história digo que ele pagou a conta antes de repetir, bebendo o último copo de cerveja, a terceira garrafa que matava, já intimo do lugar.
Ainda no táxi sentiu de novo a sensação, a revolução, desta vez causada pelo mocotó barato de um boteco vulgar.
Mas ai, Inês já estava morta, e envolvido no conforto do seu apartamento, pijama trocado adormeceu tranqüilamente tendo a certeza de que o guincho da seguradora rebocaria o carro, e o deixaria cara limpa na garagem a espera da sua próxima bebedeira.
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