Bob Devasso tem disso.
Além de cumpridor dos compromissos com a pensão das ex-mulheres, odeia corrupção.
Sempre viveu honestamente, apesar de nunca ter tido um trabalho que pudesse chamar de seu.
Todas as suas mordomias, casas de luxo, carrões foram ganhos de maneira transparente.
Sua vida, contada em verso e prosa pelos amigos, sempre teve a figura da viúva ao seu lado.
E viúva aqui não é nenhuma mulherzinha gostosa pela qual tenha se apaixonado, e falecido em seus braços.
A santa viúva é o estado, o erário público, a mãe de todos os amigos que ajudam Bob Devasso a sobreviver.
Chamam-no às vezes de consultor, outras de lobbystas, algumas de intermediário, testa de ferro.
O seu bate todo mês na conta, em dólar ou em real, as vezes em euros ou yuan, religiosamente.
Discreto, nunca quis saber de onde vem a bufunfa. Seu negócio é receber e gastar.
Os pés nos palácios, numa repartição, nunca botou, assim como nunca atravessou a porta envidraçada de uma multinacional ou estatal.
Ou seja, de oficial só mesmo o bom nome, o qual não consta nem em cartão de visita.
Recentemente sentado a mesa de um boteco acertou mais uma "participação comissionada", que é como ele chama toda a dinheirama que recebe.
Mal sabia que o lugar estava sendo bisbilhotado por um promotor com ajuda de agentes da polícia federal.
Nesses momentos sua voz é emitida em sussurros, quase rosnando. Usa uma prótese que permite disfarçar o tom e a sonoridade do verbo no caso de qualquer gravação.
Dias se passaram e os federais armaram o flagrante. Justo numa puta greve dos bancos, e em meio a uma grave crise cambial.
Tinha caído na besteira de aceitar que a grana chegasse ao vivo, numa daquelas famosas maletas 007.
No que viu a movimentação dos homens de preto entrando boteco adentro, jogou para o alto o monte de notas de 100 e gritou:
"Quem foi que botou toda essa dinheirama no meu colo?! Sou um cara honesto, incorruptível."
Ao fim das diligências, do chamado processo legal saiu ileso.
Graças a uma lei que punia as empresas corruptoras, foi para casa viver a vida.
Era um cara honesto, de moral ilibada, e nada contra ele foi provado.
Monday, June 24, 2013
Tuesday, June 18, 2013
O Dia em Que Marchei pelo Brasil
Não fui a passeata com a intenção de ser contra nada.
Queria estar no meio da rapaziada, arranjar uma namorada, beijar na
boca, sei lá o que.
Tinha marcado com Zeca Traveco num botequim ali da Cinelândia, duas da
tarde pra não perder a movimentação.
Zeca Traveco gostava da bagunça sempre de olho numa mina gostosa,
daquelas que tivessem bundão.
Não foi a toa que ganhou o apelido. Certa vez foi atrás de uma que
tinha a mesma coisa que ele, só que com a traseira recheada de silicone. Mulherengo
nato, nem prestou atenção na mão peluda e na cara com barba por fazer do
traveco.
Como sempre atrasado, me deixou ali esperando por mais de uma hora,
tomando uma gelada de olho na movimentação.
Cansado de esperar fui vendo passar as mais variadas figuras.
Tinha engraxate querendo uns trocados, punk com boca de índio,
periguete assanhada de livro na mão, vozona dependurada na bandeira do Brasil
levando o neto a tiracolo, executivo de terno e gravata estendida no pescoço,
senhoras com antigos trajes do movimento hippie, ou seja, com todo tipo de
gente tinha que dar certo, pois o Brasil estaria ali representado.
Quando Zeca Traveco chegou tomamos mais uma, paguei a conta, e
começamos a nos perguntar como seria.
Em frente ao Municipal vi umas meninas pintando o rosto, com a mesma
pintura do “fora Collor”. Foi só olhar na direção e veio uma pintando meu
rosto.
A última vez que tive o rosto pintado foi no “bloco das piranhas” lá do
bairro. Nunca mais me esqueço da namorada rindo de mim com aquela cara de
veado.
Vencido o constrangimento comecei a me sentir mais enturmado. Já não
era mais aquele careta desbundado que, além de não andar de ônibus não
descolava o traseiro da frente do computador pra ir na rua tomar um café.
Na altura do prédio da Caixa Econômica comecei a cantarolar a minha primeira
palavra de ordem. Ao meu lado, Zeca Traveco tinha começado a se dar bem com uma
mulherona, que carregava na mão a bandeira de um certo PCO. “Mãos ao alto, a
tarifa de ônibus é um assalto!” aprendi no grito alto da companheira de caminhada.
Mas não estava legal, faltava algo, faltava birita. Gritei pro Zeca: “A
gente se encontra na Candelária”, e tomei o rumo da São José em busca de um bar
aberto.
Encontrei um na estação das barcas, cheio de gente bonita e azaração.
Com aquela cara pintada e a bandeira do Brasil no ombro, caída não sei
de onde peguei moral.
A turma que estava ali tinha bateria, apito, um monte de ziriguidum, e
eu, de cara mamada sou porta bandeira e mestre sala ao mesmo tempo.
A garotada me incorporou a turba e quando dei por mim já estava em
Niterói, aos pés de Arariboia, bravo guerreiro que se postou ali depois do
quebra-quebra dos anos 60.
Como fui parar em Jurujuba não sei.
Só sei que a moça que me livrou da porrada da PM, fugindo do cheiro do
gás lacrimogêneo, gostou quando cantarolei para ela o hino da “Internacional
Socialista”, e me curou do porre com café e banho.
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