de JANAINA FIDALGO e LUCAS NEVES
da Folha de S.Paulo
Festival gastronômico reúne 41 bares de Belo Horizonte que disputam os melhores tira-gostos
No lugar de café, pão com manteiga, suco e cereal, rabinho de porco com jiló, costela de boi com torresminho e dobradinha com bacon dão início aos trabalhos. Doze horas depois, mais do mesmo: cupim assado, torresmo, azia, torresmo de novo, sentimento de culpa e a lembrança do torresmo.
Abrir mão do café da manhã (e de qualquer outra refeição convencional) era a única maneira de cumprir o plano traçado pela reportagem: experimentar, em 48 horas, os 41 tira-gostos do Comida di Buteco, festival anual em que o público elege o melhor bar de Belo Horizonte. Neste ano, a maratona começou em 11/4 e vai até 11/5.
Mapa da cidade e antiácido à mão, partimos ao encontro do colesterol em plena sexta à noite, no último dia 11: um, rumo ao Barreiro, no extremo oeste, 21 bares pela frente; o outro, em direção a Venda Nova, ao norte, primeira de 20 paradas.
Já nas horas iniciais, desenhou-se o perfil dos bares participantes: estabelecimentos familiares, identificados com seus bairros e que têm "uma culinária simples, da casa da gente", como explica Eduardo Maya, criador do festival. "A idéia é preservar os bares tradicionais, informais", diz Maria Eulália Araújo, sócia de Maya.
O saldo dos 31 dias gira em torno de 3.000 porções por bar, uma clientela estimada em 500 mil pessoas (das quais 66% mulheres), cerca de 130 mil votos válidos e casas superlotadas. "O sonho dos donos dos bares é que a gente faça isso três vezes por ano", gaba-se Maya.
Créu
Há quem leve a competição tão a sério que compara a criação do petisco à de um enredo carnavalesco. "Isso aqui é como uma escola de samba. Acabou um ano, se estou classificado, já penso no outro", diz Nicola Vizioli, dono do Família Paulista, que "contrabandeou" galinhada, canjiquinha e tutu de feijão para um combinado de sushis.
Tão curiosos quanto algumas combinações de ingredientes são os nomes dos tira-gostos: créu, rabo apertadinho, atola-coxa, com a mão no rabo doce... Quem começou a brincadeira foi Bené, do Bar Temático, que em 2005 criou o "fenômeno no barraco de chantilly", referência ao pega-pra-capar ocorrido no casamento de Ronaldo e Daniella Cicarelli, na França, por causa da "penetra" Caroline Bittencourt. O prato? Joelho de porco à pururuca com língua defumada empanada e (um amargo) doce de jiló.
Romaria "light"
A peregrinação pagã pelos concorrentes do Comida di Buteco é um roteiro que ganha cada vez mais adeptos. Pelo segundo ano, a administradora Andréa Antonini, 42, organiza uma romaria motorizada, que reúne de 12 a 15 botequeiros. "Contratamos um microônibus, e o motorista vai antes a todos os bares programados para ver como se faz para parar e nos deixar na porta. Assim, não perdemos tempo, pois são muitos bares", diz ela, que, no último sábado, eliminou seis de sua lista. "É importante transmitir a tradição das comidas de boteco, porque Minas é boteco, não tem outra opção para a gente."
E, se na capital dos bares não há como fugir deles, o jeito é minimizar os estragos. Uma semana antes de o festival começar, a nutricionista Gisele Magalhães, 33, começa a ser procurada pela turma do colesterol. "Vai chegando a época do festival, vira um inferno. Eles trazem um folder com os tira-gostos de cada bar, dizem em quais vão e perguntam: "O que eu faço?" Oriento a não irem todos os dias. Mas aviso que peso ninguém vai perder."
Quarenta e um petiscos e algumas cenas insólitas depois (o garçom de um bar fez cara feia quando a reportagem sondou a possibilidade de receber algo além de um palito para degustar um prato com farta porção de farofa), comprovou-se isso na pele. Nada que, em meados de maio, dois dias de saideira não nos façam esquecer.
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